27.2.07

Babel
[ou vivemos todos em um grande deserto]


O velho Rosa, na verdade o desde sempre moderníssimo Guimarães, disse que “o sertão está em toda parte”.
Longe de mim qualquer comparação com o incomparável. Mas de certa maneira dá para dizer que Alejandro González Iñarritu brinca de Guimarães Rosa e mostra que o deserto também está em toda parte. O deserto está no Marrocos, o deserto está no México, o deserto está num lar americano, o deserto está numa Tóquio abarrotada de gente. Porque o deserto está dentro de cada um de nós.
Babel, assim como Amores Brutos e 21 Gramas, é perturbador e contraditório. Não sei dizer de qual gosto ou desgosto mais. Toda a algo pretensiosa trilogia de Iñarritu sobre as dores e angústias consegue ser ao mesmo tempo angustiante e cativante.
Em Babel, um rifle distrai nossa atenção fazendo com que pensemos que é ele, essencialmente um objeto inanimado, que mexe com a vida de todos e liga as quatro histórias do filme. Não é verdade. O que une as quatro pontas é a solidão. A solidão do marido no meio do deserto do Marrocos com a mulher (com quem estava tendo problemas de relacionamento) baleada por um tiro disparado por um menino, que vive com a família no mesmo deserto, repleto de solidões de todos os tipos. A solidão, conhecidíssima de todos nós, da adolescente japonesa que vive em um dos lugares mais frenéticos do mundo e está completamente só, isolada pela dificuldade em se aceitar, em se comunicar e em se relacionar com um pai visivelmente solitário, que em uma viagem ao Marrocos deu de presente ao guia o rifle que começou toda a história. A solidão da babá mexicana que cuida dos filhos do casal americano, e está presa no deserto da ilegalidade, da intolerância e do preconceito pela sua origem. Interessante perceber que todas as cenas capitais de Babel se passam mesmo no deserto. Sim, porque a cena da menina japonesa na danceteria mostra o deserto, o silêncio, o vazio, no meio da multidão e da profusão de cores. A cena da boate mostra, com o silêncio de Chieko, a essência da solidão dos tempos modernos.
Iñarritu fecha muito bem a sua trilogia, e sobre Crash, para muitos um filme com a mesma lógica e raciocínio, leva a vantagem de deixar as histórias em aberto, sem apelar para julgamentos fáceis de é bonzinho/é malvado/é imoral/é o amor, e pode-se afirmar quase que sem medo que foi isso, a “moral da história” no fim de Crash, que lhe garantiu o Oscar que, se Crash levou, Babel merecia muito mais.
Babel não é um filme fácil. Não dá pra sair do cinema dizendo que ele é isso ou ele é aquilo. Babel é um filme que se leva dentro da gente, e que funciona se a gente o remói, e se questiona e observa o dia a dia. É aí que ele fica bom.
E Iñarritu, que afirma que Babel é um filme sobre o que nos une e não sobre o que nos separa, acerta e erra, ao mesmo tempo, em sua afirmação. Porque o que nos une, a todos, é o deserto. O mesmo deserto que nos separa.

Ficha Técnica
Título Original: Babel
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 142 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2006
Estúdio: Dune Films / Zeta Film / Anonymous Content
Distribuição: Paramount Vantage / UIP
Direção: Alejandro González-Iñárritu
Roteiro: Guillermo Arriaga, baseado em idéia de Guillermo Arriaga e Alejandro González Iñárritu
Produção: Steve Golin, Alejandro González Iñárritu e Jon Kilik
Música: Gustavo Santaolalla
Fotografia: Rodrigo Prieto
Desenho de Produção: Brigitte Broch
Direção de Arte: Rika Nakanishi
Figurino: Michael Wilkinson
Edição: Douglas Crise e Stephen Mirrione
Efeitos Especiais: Intelligent Creatures Inc. / Lola Visual Effects

Elenco
Cate Blanchett (Susan)
Brad Pitt (Richard)
Gael García Bernal (Santiago)
Jamie McBride (Bill)
Kôji Yakusho (Yasujiro)
Lynsey Beauchamp (Isabel)
Nathan Gamble (Mike)
Adriana Barraza (Amelia)
Elle Fanning (Debbie)
Rinko Kikuchi (Chieko)
Aaron D. Spears (Oficial Lance)
Boubker Ait El Caid (Youssef)
Said Tarchani (Ahmed)
Clifton Collins Jr. (Policial)
Michael Pena (John)
Jamie McBride (Bill)

26.2.07

sei, sei...
estou atrasado com o Babel e com o Oscar...
eu sei, eu sei!
venho já.

12.2.07

O Amor Não Tira Férias
[ou mulher é bicho esquisito]



A melhor tradução do que é “O Amor Não tira Férias” está em dois momentos vividos no cinema durante o filme.
Momento 1: Jude Law se declara apaixonado para Cameron Diaz. Uma moça atrás de mim diz em tom meloso “ah, eu quero um desses pra mim”. Momento 2: Cameron Diaz resolve voltar para a casa de Kate Winslet (não, não vou explicar muito pra não atrapalhar quem ainda não viu) e encontra Jude Law desabando em lágrimas. Resultado: 4 entre 5 mulheres soltam um “oooooooooooooooooooh” digno de quem encontra um cachorrinho recém-nascido perdido no quintal.
É isso. O Amor Não Tira Férias é um filme mulherzinha. Nos Estados Unidos, chamam de “chick flick”. Não é necessariamente bom, nem necessariamente ruim. É assim, feito para as mulheres casadas ou “comprometidas” olharem para o lado e dizerem “viu, como o amor é lindo, o Jude Law é lindo, a Inglaterra é linda e você é um barrigudo grosso e pobretão”? Ou para as solteirinhas irem para casa e acenderem uma vela pra Santo Antônio (se é que ainda fazem isso) e pedirem um Jude Law, abandonado numa cestinha na porta de casa. E, para quem se dirige, funciona.
Law é Graham (papel que deveria ser de Hugh Grant, o que, na prática, daria na mesma), irmão de Íris (Winslet), que mora numa cidadezinha perto de Londres. Amanda (Diaz), mora em Los Angeles e tem uma produtora de trailers para cinema. Íris é jornalista e tem uma vida simples, digamos assim. Amanda é cheia da grana, e mora numa mansão na Sunset Boulevard. Íris tem um relacionamento fracassado com Jasper, que fica noivo de outra, e Amanda descobre que o marido/namorado tem um caso. Pela internet, as duas trocam de casa: Amanda vai para casa de Íris, e Íris vai para casa de Amanda.
O resto é a fórmula-filme-para-mulher: elas descobrem o quanto eram infelizes, entendem que eram envolvidas com machões safados e sem a menor sensibilidade, descobrem uma nova vida, descobrem novos amigos perfeitos, novos amores perfeitos, em lugares de sonho, e todos acabam felizes e unidos pelos laços da amizade e do amor, na noite de reveillon. Pareci machista? Desculpe, não era a intenção. É que os roteiristas pensam mais ou menos assim, mesmo. Porque é uma fórmula, sabe? E, nessa fórmula, Nancy Meyers, diretora e roteirista, vem se especializando. Competente, segura a barra, sem grandes arroubos criativos. Até porque não era pra tê-los, mesmo, já que a fórmula chick flick, em tese, não permite que eles existam.
Ponto para as referências ao cinema, com trilhas citadas e a ponta, na verdade uma micro-ponta, de Dustin Hoffmann. Ah, tem ainda o Jack Black, que nunca conseguiu me agradar, e continuou sem me agradar, apesar de seu personagem ter se dado muito bem no final.
Então, ficamos assim: a mensagem que fica quando O Amor Não Tira Férias acaba é que você, mulher moderna, linda, profissional talentosa e descolada, pode ser moderna, descolada, linda como Kate Winslet ou Cameronz Diaz, brilhante em sua profissão e rica. Mas tudo o que você quer, mesmo, é um príncipe encantado, um homem pra chamar de seu, que preencha sua vida com muito amor, carinho e compreensão, e que é impossível ser feliz sem que um desses passe o braço musculoso, pero sensível, pelas suas costas, no meio da madrugada.

Ficha Técnica
Título Original: The Holiday
Gênero: Comédia Romântica
Tempo de Duração: 138 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2006
Site Oficial: www.sonypictures.com/movies/theholiday
Estúdio: Columbia Pictures Corporation / Universal Pictures / Waverly Films / Relativity Media
Distribuição: Sony Pictures Entertainment / Columbia Pictures / Universal Studios Inc. / UIP
Direção: Nancy Meyers
Roteiro: Nancy Meyers
Produção: Bruce A. Block e Nancy Meyers
Música: Hans Zimmer
Fotografia: Dean Cundey
Desenho de Produção: Jon Hutman
Direção de Arte: Dan Webster
Figurino: Marlene Stewart
Edição: Joe Hutshing
Efeitos Especiais: Snow Business International / Furious FX

Elenco

Cameron Diaz (Amanda Woods)
Kate Winslet (Iris Simpkins)
Jude Law (Graham)
Jack Black (Miles)
Eli Wallach (Arthur Abbott)
Edward Burns (Ethan)
Rufus Sewell (Jasper)
Miffy Englefield (Sophie)
Emma Pritchard (Olivia)
Sarah Parish (Hannah)
Shannyn Sossamon (Maggie)
Bill Macy (Ernie)
Shelley Berman (Norman)
Kathryn Hahn (Bristol)
John Krasinski (Ben)
Hope Riley (Sarah Smith-Alcott)
Gilbert Esquivel (Jesus)
Dustin Hoffman
Lindsay Lohan
James Franco